Esta é a delicada bruma que desliza pelos cantos e recantos da minha circunstância. Nasce nas bermas do Atlântico, a cada onda que rebenta um pouco, aos poucos e é assim, dispersas as gotas pelas suas correntes de ar inexoráveis e intemporais que, aos poucos e poucos, a bruma vai galgando, paciente e conscienciosamente as colinas, entre o arvoredo, ao longo dos trilhos, por cima dos muros, torneando casas e palácios que sobrevivem ao tempo e aos tempos, sólidos demais para se preocuparem com o assédio de ventos inóspitos e adulterados, até chegar ao cimo da colina, ao topo deste Monte onde a alma, esse sentir que se identifica e depois se confunde e no final se transfigura na realidade que nos envolve, e se veste da própria bruma, aquela que dá as mãos, abraça e beija estes verdes entrelaçados uns nos outros, os refresca com a água que transporta lá do fundo do horizonte, por desígnio do mar, que forma parte deste todo e que sem ele nem estes verdes existiriam, nem a bruma, nem a minha alma poderia algum dia ser aquilo que vejo, o que me rodeia, a realidade. Isto sim, faz-me sentido, ser, com a água, a terra, as plantas e as brisas, o Universo, o todo, aquilo que perdurará até ao final dos tempos. Esvai-se a bruma, regresso ao meu espaço, consciente de que nem sempre é a ciência que explica a realidade mas sim a vontade/ capacidade de sentir-nos parte ativa do que nos rodeia. Não me parece não ser bem vinda nesse mundo onde reina a harmonia, a paz e a sabedoria. Acho até que o que se espera de nós, o que esta realidade espera de nós é que ponhamos a nossa alma ao serviço deste Universo. Mas para isso há que ser bruma. Esta bruma.
30 maio 2025
 
