O sol acorda límpido na timidez da paisagem deslavada e esbatida que se abre, de par em par nesta manhã de dezembro, a anunciar um inverno frio e rigoroso. Há uma calmaria sossegada e silenciosa que se estende pela encosta abaixo até ao mar, uma ténue faixa azulada no gigantesco pano de fundo cinza claro. O infinito que contemplo nestes meus amanheceres sozinhos nunca é igual, nunca se repete, nunca se aborrece nas cores com que se veste para cumprimentar o dia, ao nascer. E a mim, que sou sua fiel companheira desde que o descobri, dentro de mim, na corrida pela procura do sentido a dar a esta existência misteriosa e enganadora que é a vida. Sou o que vejo e vejo o que sou. E sou tão infinito como o que se projeta pela encosta abaixo e sobe, sobe pelo horizonte até se perder de vista. "Também tu podes mergulhar dentro de ti e perder-te de ti próprio, largar a mão que te protege e retém e ser infinitamente, até te perderes de vista", disse-me baixinho num dia de cumplicidade. E assim é. Regresso sempre para me renovar tantas vezes quantas me apetecer e souber e querer ser como esta paisagem que abro e estendo logo pela manhãzinha para que cheire a frescura e brilhe de cor. E um dia voarei como este pássaro que acaba de cortar o silêncio parado e denso dos meus pensamentos, até ao infinito e, diz o mistério que regressarei com ele, cada manhã, ao abrir do dia, para quem me quiser ser. Adoro mistérios.
 
 
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