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domingo, 27 de março de 2016

O ser humano Cristo


Será que Jesus, a sua história, os seus ensinamentos e a sua doutrina fazem sentido se o despojarmos da sua dimensão divina? A Igreja Católica e os cristãos, em geral, dirão que não, como é lógico. Independentemente de fazer ou não sentido dizer-se que Jesus só é plenamente entendido na sua dimensão divina, penso, também, que esta é uma forma da Igreja Católica poder reivindicar, em solitário (ou quase) os seus direitos de "propriedade" sobre o papel que deve ser dado à figura de Cristo. No entanto, e face aos inúmeros fatores de desagregação e de mudança rápida e tumultuosa na sociedade em que vivemos, a figura do Jesus criador e apologista de um modelo social e de convivência baseados no amor, emerge como um líder de uma atualidade, eu diria, assustadora, no bom sentido.
Se Jesus, hoje, estivesse entre nós, que responderia à pergunta que todos, sem exceção, nos colocamos face à escalada do terror e à nossa incapacidade mais absoluta para lidar com ela? Seja ela qual for, seria sempre a mais radical entre todas as que podemos imaginar. Que diria? Eu procuro, nos Evangelhos, a resposta e, nestes dias de profunda inquietação pelo nosso futuro coletivo, penso que nos animaria a estender a mão, dar a outra face, oferecer o abraço e inclusivamente a nossa vida a quem mais nos faz sofrer. Dirão: Impensável. Impossível. Será? O amor, como ele nos ensinou, como base do nosso entendimento e convivência coletivas, é assim tão irrealista? E sendo tão irrealista quanto possa ser, não seria, apesar de tudo mais eficaz? Cristo, líder humano e político, no sentido amplo, é inspirador e devia ser dado um maior relevo à sua doutrina e ensinamentos como base de uma sociedade mais justa e fraterna. (a democracia cristã, infelizmente, falhou a tentativa). Hoje celebramos a sua dimensão divina, portanto, para os que nela acreditam, desejo um bom dia de celebração.

sábado, 26 de março de 2016

What is beauty?

O belo existe e enche-me a alma ou será que o belo habita algures na minha alma e se polvilha, como um pó mágico nas coisas que me rodeiam e nelas recria paisagens e instantes únicos e irrepetíveis de beleza?

terça-feira, 22 de março de 2016

Poesia

"Não, meu amor,
não me deixo intimidar
pelas regras 
doutas e pesadas
que se inventaram
apenas para impedir
que chame poesia
à melodia
que a tua alma me
inspira
e que se escreve
com palavras
que não cabem
num poema
espartilhado
de rimas contadas
e cadência
ditada
por uma pontuação
forçada
de rigor.
Não, meu amor,
não vou obrigar
a doçura do teu olhar
a rimar
num verso vulgar
não pedirei às tuas mãos
nas minhas, apertadas
que rezem a eternidade
numa qualquer oração
nem quero imaginar
que a tua gargalhada
de cristal genuíno
tenha de ser interrompida
pelo final de uma quadra
ou que a tua fantasia
não possa deslizar
traquina e irreverente
de um soneto
aborrecido
para o leito de um hino
à alegria de viver.
Poesia, meu amor,
é escrever-te
nas palavras
em que em mim te inventas
cada dia
é cantar-te, devagarinho
nos acordes
em que em mim te recrias
com fantasia
é pensar-te com rebeldia
é viver-te, sem pensar
se o que escrevo por te amar
se chama poesia."

domingo, 20 de março de 2016

O mistério das boas-vindas das glicínias

Pela janela do meu quarto, aberta sobre o jardim das minhas delícias, atravesso a porta de embarque para uma nova viagem que me leva a passear pelo mistério das minhas glicínias, as que plantei, deve fazer agora 20 anos, mais ou menos, nuns vasos grandes que ladeiam a porta de casa que se abre para o jardim. Comentava eu, ontem, ao meu filho Luis, expressando assim uma estranheza que me anda a incomodar há já umas semanas, que alguma explicação deve ter o facto de, pela primeira vez, desde que as plantei, as glicínias terem explodido numa profusão de cachos que anunciam, para os próximos dias, semanas, uma sinfonia fantástica de formas delicadas e graciosas de cor, como nunca vi, nunca pensei que pudesse acontecer e que me surpreende e me proporcionam esta viagem pelo pensamento em busca de uma explicação.
Já aqui expliquei que tenho uma relação especial com as plantas que habitam o meu Universo. Plantas que lutam umas com as outras para terem o meu afeto em exclusividade, plantas que se vestem de gala quando lhes dou atenção, plantas que me odeiam ou me ignoram mas plantas com quem (as quais) tenho uma relação especial. Terei sido planta, eu também, no começo dos tempos? Alguma das minhas partículas terá sido partícula a correr pela seiva de algum dos antepassados dessas plantas? É provável, sabe-se lá o que aconteceu há milhões de anos para trás e o que sabemos é que nada se perdeu e tudo se transformou e que todos somos feitos do mesmo...comentei, pois, ao meu filho Luis que as glicínias este ano estavam em flor, pela primeira vez, pela simples razão de que eu tinha vindo habitar a casa e que essa era a forma de elas expressarem o seu contentamento. Não lhes ligo nem mais nem menos do que o fazia no primeiro dia e tenho feito ao longo destes anos e é verdade que as plantei porque são as flores que mais adoro, logo a seguir às flores do jacarandá e dos lilases. Revejo-me nas cores, na delicadeza dos cachos, na força dos troncos, na teimosia do nós com que se torcem e resistem e insistem até chegar onde chegam. Algo devemos ter, pois, em comum e é a alegria dessa irmandade e fraternidade partilhadas que hoje leva as glicínias a florirem à porta do meu jardim. É um boas-vindas dito e expresso à sua maneira, que, por serem recebidas com amizade, carinho e respeito, as motivam a florir desta maneira exuberante e surpreendente. E regresso, pois são horas do segundo café!

sábado, 19 de março de 2016

Portas de embarque...

Porta de embarque para mais um vôo intergaláctico no meu avião privado que é propulsado a imaginação. Leva-me onde quero, pára onde farejo alguma curiosidade, não precisa de autorização para aterrar, nem está sujeito a regras de trânsito. ...Todos temos uma porta de embarque aberta 24 sobre 24 horas que nos leva onde queremos...a minha, agora, é esta janela velhota e a precisar de pintura que se abre sobre uma paleta de cores, de sons e de formas que mudam a cada instante de luz, a cada momento do dia, a cada estação do ano, ora em sossego ora em trânsito, uma janela sobre uma orquestra sempre pronta e preparada para levar-me a viajar pelo Universo na sonata, no concerto ou na ária, lentas, doces, feéricas ou empolgantes nas quais, em cada momento, a minha imaginação se revê e parte em busca de novos mundos.

sexta-feira, 11 de março de 2016

O misterioso "Non written Google sexual personality translator for professional aims"

Ao longo da minha já extensa carreira profissional sei e senti que fui muitas vezes discriminada pelo facto de ser quem sou e como sou. Eu sou como sou, na esfera profissional, e não tenho qualquer dúvida de que se tivesse sido homem, os mesmos traços teriam jogado a meu favor e não em contra, como jogaram vezes...sem conta. Não sou um caso isolado. Sei que há muitas mulheres que se podem sentir identificadas com esta minha reflexão.
Todas sabemos que existe um "non written google sexual personality translator for professional aims", que, como por magia, transforma os atributos, qualificados como "defeitos e constrangimentos", quando detetados numa mulher, em inegáveis "virtudes e ativos" quando exercidos pelos nossos homólogos, homens.
Alguns exemplos: onde se lê "conflitiva" leia-se "lutador"; onde se lê "idealista", leia-se "criativo", onde se lê "teimosa", leia-se "determinado"; onde se lê "embirrenta", leia-se "com caráter", onde se lê "mete-se em tudo", leia-se "capacidade operacional". Onde se lê "autoritária" leia-se "com autoridade". "Falta de flexibilidade" será "ideias claras". "Frenética" será "pro-ativo". Sem dúvida que "agressiva" dá lugar a um digno "enérgico" e se pelo contrário nos apelidam de "branda", nele, a brandura será sempre vista como "capacidade de compromisso". E por aí fora e por aí adiante. E quando alguma vez me disseram que era uma "complexada" por lutar incessante e enérgicamente pela afirmação contundente da minha valia profissional, senti na pele até onde podiam ser profundamente malignas essas farpas constantes que desferiam contra a minha confiança e a minha auto-estima.
O homem e a sociedade onde vivemos, aqui a nossa, são muito conscientes da existência deste "google translator" que, em regra, e face aos mesmos traços de personalidade, aqueles que nos permitem sobreviver num mundo concorrencial e onde existem milhões de obstáculos no nosso caminho, a nós nos desvaloriza enquanto que a eles, os valoriza enquanto profissionais.
Há, como não, discriminações muito mais gritantes e graves. Mas elas não nos devem fazer esquecer estas discriminações que são as que, com outras igualmente subtis, impedem, muitas vezes, as mulheres de chegar ao topo dos postos de decisão. Eu sou particularmente sensível a elas e por isso deixei aqui esta reflexão.

quarta-feira, 9 de março de 2016

A realidade behind the scene


As fotografias que retratam a imponência dos cenários, a épica das palavras e a força dos símbolos não nos devem fazer esquecer a fotografia que melhor descreve a nossa realidade e o nosso destino: a de um dia chuvoso, baço, sem horizonte, frio e inóspito. Quem o molda pouco lhe importa o nosso passado nacional glorioso e ri-se das ambições de um futuro nacional brilhante porque sabe que carregamos uma dívida de tal forma astronómica que para sempre estaremos dependentes das decisões que mais convierem aos credores. E estes o que querem? Querem um Governo que aja como agente dos seus interesses, um Presidente que vá adoçando a vida do povo com histórias entretidas, uma Justiça dirigivel e um conjunto de decisores que a tudo se prestam se com isso se puderem manter no poder ou enriquecer, conforme o âmbito onde atuam. Para quê? Para que neste couto que é o nosso país, os clientes dos credores possam caçar os seus mais diversos prazeres: comprar negócios rentáveis, ter casas bonitas, propriedades apraziveis, reformas douradas. O povo português? Para sempre de canga às costas, dócil, triste e resignado. 

Não tenham nem se façam ilusões. Porque por muito que o nosso flamante e recém-estreado Presidente queira o contrário, por muito que António Costa se esforce em recriar cenários de soberania, por muito que nos esforcemos e empreendamos coletivamente, por muito que sejamos "indomáveis inquietos criativos"...a maçã proibida foi comida e o mal está feito. Por isso anda o agora lider da oposição satisfeito, confiante e orgulhosamente só. Porque sabe que foi escolhido pelos que mandam nos credores para ser o gerente desta colónia à beira-mar plantada. Tão confiante anda que até se dá ao luxo de gozar connosco e etiquetar a sua gerência de social-democrata. E tão pacóvios somos, tão embrutecidos estamos, tão baixo descemos na dignidade, tão anestesiada temos a bravura e tão amolecido temos o nosso proverbial espírito satírico que nem sequer temos força para dar uma sonora gargalhada e fazer um valente manguito.
Eu não digo que não haja uma saída. Claro que sim. Mas ela só é equacionável e visivel para quem aceite que a realidade temos e a que nos espera é a que acabo de descrever e que tem lugar behind the scene. O dia de hoje podia ter sido de primavera, como o de ontem mas não foi.

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