Os ingleses têm uma expressão muito sugestiva para caracterizar aqueles momentos em que, perante uma realidade que se apresenta aparentemente inconciliável, nos sentimos confusos, perplexos, desconcertados: I am puzzled. Todos nos encontrámos já, muitas vezes, nessa situação: peças que não encaixam umas nas outras, que nada têm a ver umas com as outras, que se anulam ou se sobrepõem. Sabemos que as temos que usar a todas mas não há forma de conseguirmos usá-las todas na construção de um desenho coerente...I am puzzled. Eu sinto-me um pouco assim quando olho para a realidade à minha frente. Muito do que vejo e observo são peças, complexos de peças que navegam, aparentemente, sem rumo nem sentido, num oceano que não pára de oscilar, provocador e desafiante, tornando ainda mais difícil e instável, a construção de um desenho, uma imagem, uma explicação coerente e produtiva. Há a tentação de dar explicações parciais, por conveniência, por oportunismo, por ignorância. Nenhuma delas resiste porque as peças não utilizadas não desaparecem e teimam em aparecer. Se não houver quem as detecte, o tempo encarrega-se de as trazer à tona e dar cabo das explicações apressadas.
Não há fórmulas mágicas para compreender o Todo que nos rodeia. Nem ciência exata que o explique. Nem a experiência, por si só, tem as respostas. Isto leva-me a pensar que existe uma determinada "distância" que é preciso construir, onde nos temos que colocar, para conseguir visualizar o desenho que usa todas as peças que temos na frente. Não é apenas uma distância geográfica, nem temporal, nem intelectual nem empírica mas sim o conjunto de todas estas distâncias, na proporção certa, com a combinação certa, com a chave correta: a que mobiliza todos os ativos armazenados no cérebro, não sei quais, e que constrói a imagem certa. Ele há uma atitude certa para que este processo tenha uma chance de acontecer: a humildade. A aceitação de que não sabemos. I am puzzled. Mais sugestivo, não há. Mais eficaz, também não. E mais inteligente, também não. O ponto de partida para resolver uma realidade absurdamente desconcertante. Let us be puzzled first, to "step back" afterwards to see the big picture at the end.

 
 
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