26 dezembro 2022
Chove Insistentemente. Como se houvesse a necessidade desesperada de lavar a face ao Universo, deixar correr a água com abundância e determinação para dissolver os excessos com que fomos sufocando a vida. O que é que nos faz pensar que poderemos um dia, algum dia, dominar o que se repete desde o início e sabe-se lá se não mesmo antes disso, que sabemos nós? Eu não sei e duvido que alguém, como nós, conheça ou venha a conhecer todas as regras e fórmulas e equações que determinam esta vontade persistente e indiferente e milhares de vezes superior à nossa pequenez de lavar a face ao Universo quando é preciso. Olho e observo a chuva, a água a cair, a rolar, a empapar, a lavar a fundo e quando isso acontece sinto-me infinitamente mais serena, mais em paz e por isso mais feliz. O verde fica, sem dúvida mais verde, os delicados filamentos da erva mais tesos e afirmativos, as laranjas rejubilam de cor e frescura. Os fetos galgam sem esforços as braçadas das árvores e a passarada não cabe em si de contente. Até o chão parece anos mais novo sem aquele ar cansado e gasto de quem leva anos a trabalhar sem trégua nem propósito. Dá gosto vê-lo a chapinhar nos carreirinhos que o atravessam, a rir com as cócegas que as pedrinhas lhe vão fazendo, voltou a ser criança. Vida! É vida, é a vida a pingar por todos os lados numa vontade teimosa e convicta de se impor, de se nos impor e de ser ela e a suas fórmulas a ditarem as regras de tudo e todos. Nós não somos nem mais nem menos, somos o que somos e se não nos precavemos um dia escorreremos dissolvidos em pó pela ribanceira abaixo até ao mar. Meras pedras de sal num vasto e extenso oceano de chuva persistente gerida por outros que não, certamente, nós.
 
 
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