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terça-feira, 25 de junho de 2024

Pergunte-se à vida, quando ela bater à porta

Há momentos em que a vida vem ter connosco para conversar sobre temas que não têm muito a ver com a agenda da semana e queiramos ou não, há que deixá-la entrar em casa, sentá-la onde se sinta confortável e dedicar-lhe o tempo que for necessário até que diga: "Missão cumprida". Não sabemos bem quando vem, as vezes que isso me aconteceu, algumas, suspeitava que apareceria, mais dia menos dia, outras ela apresentou-se, sem convite, sem ser esperada, do nada e instalou-se sem pressa nenhuma de me deixar entregue a mim própria. Cão de fila...

Tenho-a por uma pessoa inteligente, culta, caráter assente em vigas de sólidos princípios e armadura de valores consistente, resistente às avarias do tempo, às vicissitudes e contextos, entenda-se. Não abre logo o jogo, é reservada, atenta, observadora e por vezes joga comigo um poker facial que me desconcerta e me deixa nervosa, a mim, mais do género de não ter grande paciência para jogadas preparadas cheias de fintas e passinhos de dança curtos e rocambolescos, por favor vai direta ao assunto, já não somos crianças e posso bem ver o que te vai na cabeça e onde queres chegar e o que pretendes realmente, por isso, despeja e não me faças perder o tempo.
Vem com o intuito de me questionar, pôr à prova, alertar, em modo prevenção e, ao que parece, com a missão, diz ela, convencida de que assim é, de me ajudar, pois ao que parece, o perigo está em mim, na minha pessoa, em determinados atributos do meu "sistema operativo", em algumas funcionalidades e "automaticidades" que derivam em consequências, aparentemente, negativas para mim. "Sabe, (a vida trata-me por você, é engraçado, mas eu prefiro manter este escudo que nos protege dos perdigotos da familiaridade em excesso) nem sempre somos o melhor conselheiro de nós próprios, e no seu caso, tem acontecido que deixá-la nas suas únicas mãos, não tem sido o melhor para si."
E obriga-me a rever, a desconstruir, a recomeçar e vai uma e vão duas e as vezes que forem precisas de análise, balanço, os prós, os contras, o direito e o avesso, os cantos todos, as re-entrâncias, os esconderijos, alçapões e por trás das portas secretas, sem descanso, sem pausa, a pão e água até ela concluir que não fui atraiçoada por mim, não sou minha refém, não me silenciei nem me substituí a mim própria e não sou uma impostora qualquer que veio encenar um papel que ela considera não dever ser o meu, o que me corresponde, o que ela imprimiu na palma da minha mão, no início dos tempos...
É a vida a passar-nos contas, de lápis afiado atrás da orelha e bloco de notas com linhas, severa sem dúvida, mas também generosa...como uma avó e a verdade é que se ela não existisse e esta sua missão não fosse levada a cabo, quando necessário, eu sentir-me-ía mais só, mais perdida, mais à mercê daquilo que me faz perder o equilibrio, a estabilidade e me desvia do propósito que me trouxe aqui. Sei bem qual é o meu e cada um saberá qual o seu. Se não, perguntem à vida, quando ela vos bater à porta.

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