Estou cansada de vozes, das vozes, do barulho que fazem, do incomodativo que podem chegar a ser por interromperem. (Já não falo dos barulhos outros que não as vozes, o que digo aqui poderá ser extrapolado para outros ruídos). As vozes, os sons que saem da boca das pessoas, digam coisas inteligentes ou disparatadas, interessantes ou desprovidas de contribuição que seja para a nossa maior felicidade, uma oitava acima ou uma oitava abaixo, melosas ou ásperas, fluídas ou com aquelas interrupções que exasperam imenso...as vozes cansam-me. E hoje em dia há uma incontinência verbal que de riacho se fez rio e que com as barragens e todas as infraestruturas e máquinas inventadas para controlar o. volume de caudais, do que for, água, ondas, vento, moeda, circulação, se transformou num delta de dimensões completamente desproporcionadas, riam-se do delta do Amazonas ou do Mekong ou dessas massas de água que desembocam a uma velocidade estonteante, arrastando consigo volumes de água que não consigo quantificar. Hoje em dia, toda a gente fala demais, alto demais, interrompe, intervém, quebra, sente-se no direito, desagua ali onde vê uma oportunidade (uma planície, por exemplo, um desvio no terreno) e desaba sobre nós com todas as palavras que conhecem dos dicionários ou que aprenderam não sei onde, sem contemplações. E repito. É indiferente o que digam ou como digam ou quando digam. A contrariedade com que hoje me tenho de debater, é o simples facto de produzirem sons quando não devem, ninguém lhes pediu, não são esperados nem trazem felicidade mais do que aquela que existe - sempre - no silêncio. Um silêncio que não tem que ser necessariamente a ausência de sons, nada disso. Um silêncio feito de sons que a sábia e respeitosa e delicada Natureza nos proporciona e que contribuem, pela forma como se articulam. entre si, se encaixam uns nos outros, se complementam, se acrescentam - sem Maestro - para criar o silêncio que ouvimos. Porque nós ouvimos o silêncio, é mentira quando se diz que o silêncio é a ausência completa de som. Não é! As vozes não humanas com que a Natureza nos brinda são o silêncio que precisamos para nos reencontrarmos, para nos ouvirmos, para falarmos connosco, com os que somos, para apreciarmos os pequenos detalhes com que a alma oscila, o coração bate, as pálpebras descem, a água desce pelo esófago, o sono nos vence, o despertar nos acorda, devagarinho, no silêncio da madrugada. Pare-se de falar. Tirem o som às vozes. Aprendam a dizer sem ter que vomitar chorrilhos de palavras que ditas...perdem toda a beleza e a poesia que a vida tem, neste silêncio.
11 outubro 2024
 
 
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